A história do Retábulo de Gante, ou A Adoração do Cordeiro Místico, é uma epopeia queatravessa séculos, marcada por guerras, roubos, incêndios e milagres de sobrevivência. Criado pelos irmãos Hubert e Jan van Eyck e concluído em 1432, o monumental conjunto é considerado uma das maiores obras de arte da história da humanidade — um ponto de virada na pintura ocidental e uma das criações mais influentes já concebidas.
Composto por dezoito painéis em carvalho, o retábulo reúne uma série de visões bíblicas, cujas figuras repousam no limiar entre o humano e o sagrado. As superfícies foram cobertas por finas camadas de giz e cola animal antes de receberem a pintura a óleo — técnica que Jan van Eyck dominou como ninguém. A aplicação meticulosa de camadas transparentes confere às figuras uma luminosidade quase sobrenatural, como se a luz irradiasse de dentro para fora.
Hubert van Eyck, o irmão mais velho, iniciou a obra, mas morreu antes de vê-la concluída. Coube a Jan — o verdadeiro alquimista da cor — terminar o retábulo, transformando o óleo em veículo de revelação e transcendência.
Mas o destino da obra seria tão dramático quanto seu conteúdo místico. Durante a Revolução Francesa, em 1789, o retábulo foi arrancado da Catedral de São Bavão e levado a Paris em carroças puxadas por cavalos. Já durante a Segunda Guerra, Hitler ordenou que fosse escondido em uma mina de sal, e apenas a coragem de mineiros anônimos impediu que a obra fosse destruída junto com centenas de tesouros artísticos.
Roubos e desaparecimentos marcaram sua trajetória — entre eles o célebre sumiço dos painéis Os Juízes Justos e São João Batista, em 1934. Pouco depois, uma carta anônima exigia um resgate de um milhão de francos belgas. As autoridades recusaram pagar. Apenas o painel de São João Batista foi devolvido; o outro jamais foi encontrado.
Hoje, após sucessivas restaurações, o Retábulo de Gante continua a brilhar com a mesma força de há quase seis séculos. Diante dele, é impossível não sentir que a história da arte se dobra em reverência — e que, de alguma forma, Jan van Eyck ainda observa o mundo com o mesmo olhar que transformou a pintura em pura luz.
Essa postagem sobre o Retábulo de Ghent nos levará necessáriamente à uma futura postagem sobre o mestre Jan van Eyck.
O Retábulo e suas partes:
O Retábulo Aberto
O Retábulo fechado
Adão e Eva
Os patrocinadores. O Retábulo de Ghent foi originalmente instalado acima do altar de uma capela fundada por Joos Vijd e sua esposa Elizabeth Borluut. São estes abaixo, também retratados na obra.
Entre os doadores estão as estátuas de João Batista (à esquerda) e João Evangelista (à direita). Na época da concepção do Retábulo de Gante a igreja não era dedicada a São Bavão e sim a João Batista.
Os anjos da anunciação
A adoração do cordeiro místicoA música celestial
O retábulo culmina na hieraquia celestial do Deus Entronizado, ou Cristo em Majestade, ladeado de cada lado pela Virgem Maria e João Batista.
A restauração
Fontes: Visit Gent, closer to Van Eyck, The Collector,
